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“Nem todo o que me diz: Senhor, Senhor!
entrará no reino dos céus, mas aquele que
faz a vontade de meu Pai, que está nos céus.”

(Mateus 7:21)

Espírito protetor (ou Anjo da Guarda)

  

 

O que é o Espírito protetor? Qual sua missão perante nós? O que nos predispõe a um contato mais intenso com ele? É-nos possível ter uma relação mais direta com ele?

 

 

O cantor e compositor Fábio Junior, ao fazer uma homenagem ao falecido pai, em seu CD “Só Você e Fábio Jr. ao Vivo”, nos reporta à relação que podemos estabelecer com aqueles que já se ausentaram desta vida, mas que continuam a velar por nós:

 

Entre as portas do visível e do invisível, uma tênue barreira nos separa da eternidade.

Além da materialidade passageira das coisas, fica o reino das coisas verdadeiras, que a gente carrega como um tesouro no coração.

Laços inquebráveis de um amor insuperável; ternuras profundas de uma amizade real ...

Mãos que se selam como guardiãs em nossa caminhada; espíritos de luz iluminando nosso coração; fantasmas familiares como guias, como forças de proteção.

Aí a gente vê que o tempo não vale nada; é pobre na estrada da evolução.

 

A Doutrina Espírita postula que, além do mundo material, existe no Universo uma outra dimensão, a que denomina de “mundo espiritual”. E essas duas realidades não estão dissociadas, visto que os habitantes desses dois mundos influenciam-se mutuamente.

        

Através dos conceitos reencarnacionistas, temos que todos nós somos, na verdade, espíritos imortais cuja trajetória evolutiva é mesclada por duas fases que se alternam sucessiva e ininterruptamente: vida espiritual seguida de vida material, através do fenômeno da encarnação (nascimento em um corpo físico); que, por sua vez, é secundada pela vida espiritual por meio da desencarnação (a morte ou o perecimento do corpo físico).  E, quando não estamos encarnados, habitamos no mundo espiritual esferas compatíveis com nosso grau evolutivo, caracterizado por valores morais, emocionais, intelectuais e espirituais já conquistados por nós.

        

Assim, para um melhor entendimento do que seria o Espírito protetor – ou o “anjo da guarda” – e, associando os princípios da reencarnação e da influência mútua entre as duas esferas, O Evangelho segundo o Espiritismo, ao abordar o tema sobre “os laços de família fortalecidos pela reencarnação”, registra:

 

Os laços de família não são destruídos pela reencarnação, como pensam certas pessoas; ao contrário, eles são fortalecidos e se estreitam; (...).

Os espíritos formam, no espaço, grupos ou famílias unidos pela afeição, pela simpatia e semelhança de inclinações; esses Espíritos, felizes por estarem juntos, se procuram; a encarnação não os separa senão momentaneamente, porque, depois da sua reentrada na erraticidade, se reencontram, como amigos ao retorno de uma viagem. (...) Se uns estão encarnados e outros não o estejam, por isso não estão menos unidos pelo pensamento; os que estão livres (vivendo, assim, no mundo espiritual) velam sobre os que estão cativos (ou seja, vivendo no mundo material), os mais avançados procuram fazer progredir os retardatários.

Entenda-se que se trata aqui da afeição real de alma a alma, a única que sobrevive à destruição do corpo, (...).  [1]

 

Em outra obra de Kardec, O Livro dos Espíritos, encontramos no capítulo 9º constante do 2º livro, 33 questões, as quais, de maneira mais ampla, discorrem sobre o que seriam esses desencarnados que, de maneira mais direta, cuidam de nós.

 

A questão 490 pergunta:

“Que se deve entender por anjo guardião?”  

        

Resposta:

“O Espírito protetor de uma ordem elevada”. Na realidade, ele é um grande afeto que trazemos do passado, e que, por ser mais evoluído do que nós, nos assiste na presente encarnação, isto é, em nossa existência atual.

        

Questão 491:

“E qual seria a sua missão perante nós?” 

        

Resposta:

“A de um pai sobre seus filhos: guiar seu protegido no bom caminho, ajudá-lo com seus conselhos, consolar suas aflições, sustentar sua coragem nas provas da vida”.

        

Em virtude de abranger vários aspectos, bastante complexa é a tarefa desse Espírito que nos ampara, pois sua assistência não deve ferir nosso livre-arbítrio. Assim, ele nos orienta, mas não determina o caminho a ser seguido por nós; protege-nos e nos alerta, no entanto, não impõe as decisões de devemos tomar, justamente para não tirar de nós o mérito de nossas descobertas e conquistas.

        

E o que nos predispõe a um contato mais intenso com esse amigo? O recolhimento íntimo e a oração sincera.

        

Pelo fato de ambos elevarem nossa freqüência energética – ou padrão vibratório – e ampliarem nossa capacidade de sintonia e percepção, é através da intuição que nosso Espírito protetor atua de maneira mais efetiva à nossa sensibilidade. É como se ele nos “cochichasse” algo, com a “voz” da nossa consciência nos sugerindo, por exemplo, o que devemos ou não fazer.

        

Mas, em razão de a intuição ser uma percepção rápida, momentânea e passageira; um lampejo súbito ou uma idéia que brota de forma inesperada, muitas criaturas não dão ao fenômeno maiores créditos, deixando, com isso, de atender a esses pensamentos mais íntimos. 

        

Entretanto, não é somente por meio desse “sexto sentido” que nosso “anjo da guarda” procura nos auxiliar. Existem outras maneiras! E quem nos fala quais são elas é o Espírito Emmanuel:

 

Ora e pede. Em seguida, presta atenção. Algo virá por alguém ou por intermédio de alguma coisa, doando-te, na essência, as informações ou os avisos que solicites.

Em muitas circunstâncias, a advertência ou o conselho, a frase orientadora ou a palavra de bênção te alcançarão a alma, no verbo de um amigo, na página de um livro, numa nota singela da imprensa e até mesmo num simples cartaz que te cruze o caminho. Mais que isso. As respostas do Senhor (e também de nossos guardiões, que nada mais são do que mensageiros de Deus), às tuas necessidades e petições, muitas vezes te buscam através dos próprios sentimentos a te subirem do coração ao cérebro ou dos próprios raciocínios e a descerem do cérebro ao coração. [2]

        

Com essas palavras, podemos perceber que são muitos os caminhos de que a Espiritualidade Maior se utiliza, para fazer chegar até nós, tudo quanto necessitamos para a sustentação do equilíbrio e da firmeza diante dos vários desafios que a vida nos lança: consolo, advertência, energias salutares.

        

No entanto, existe uma determinada ocasião em que nosso Espírito protetor “conversa” diretamente conosco, “olhos nos olhos”. E qual seria esse momento tão importante para nós?

        

É aquele a que o Espírito Cairbar Schutel enfaticamente se refere:

 

A todo instante de sua peregrinação pela vida material, o indivíduo está recebendo importantes orientações do Plano Espiritual através das intuições ou inspirações. Durante o sono, quando está em desprendimento do corpo físico, o Espírito, liberto momentaneamente, recebe, se a tanto estiver receptivo, bons conselhos dos mentores e amigos espirituais.

Dar valor e, sobretudo, seguir tais alertas tornam-lhe mais fácil a busca da evolução, viabilizando a modificação interior dos seus sentimentos.

Tais advertências podem servir para ressaltar a necessidade de autocrítica, incentivar a mudança de atitudes e mesmo deter um procedimento menos digno ou anticristão. Portanto, são sempre valiosas para a reforma íntima.  [3] 

 

A Doutrina Espírita ensina que, durante o sono físico, apenas nosso corpo repousa. Ao nos encontrarmos parcialmente libertos da matéria que descansa, ou seja, em espírito, podemos nos dirigir a regiões astrais de nosso interesse imediato, buscando, assim, o contato com seres que nos são afins, quer sejam eles superiores ou inferiores.

 

Com o recolhimento íntimo e a oração, conforme anteriormente já abordado, positivamente abrimos nossos canais de comunicação, a nossa sensibilidade, e adormecemos predispostos a permitir que nosso Espírito protetor nos ofereça uma orientação mais direta. Às vezes, nos lembramos vagamente de tal assistência, afirmando que sonhamos isso ou aquilo. Outras vezes, inconscientemente guardamos em nosso íntimo a orientação proporcionada e, no momento oportuno – quando, enfim, acordados –, agimos de acordo com aquela “voz interior” que nos diz para fazer algo ou mesmo para evitar determinada situação ou pessoa.

 

Daí a importância da oração. Através dela temos a possibilidade de minimizar os efeitos de nosso desespero e sofrimento, das nossas aflições e descrença, e nos tornarmos mais receptivos às sugestões superiores.

 

Porém, com todo esse empenho para conosco, o que efetivamente nosso “anjo da guarda” espera de nós?

 

Os instrutores da verdade espiritual desejam, antes de tudo, a nossa renovação íntima, para a vida superior. Se apenas buscarmos consolação, sem adquirir fortaleza, não passaremos de crianças espirituais. Se procurarmos a companhia de orientadores benevolentes, tão-só para o gozo de vantagens pessoais, onde estará o aprendizado? Acaso não permanecemos, aqui na Terra, em lição? Teríamos recebido o corpo, ao renascer, apenas para repousar? É incrível que os nossos amigos da esfera superior nos venham suprimir a possibilidade de caminhar por nós mesmos, usando os próprios pés. Naturalmente, não nos querem os benfeitores do Além para eternos necessitados da casa de Deus e, sim, para companheiros de gloriosos serviços do bem, tão generosos, fortes, sábios e felizes quanto eles já o são.  [4] 

 

Com o intuito de finalizar o assunto, citaremos a resposta à questão 495, de O Livro dos Espíritos, que, com sublimes palavras, veementemente nos concita à crença em nosso “anjo da guarda”, pois é ele quem fala mais diretamente ao nosso coração. É com ele que alimentamos “ternuras profundas de uma amizade real”, porque o que sustenta nossa relação e união são os “laços inquebráveis de um amor insuperável”. E é a fé, essa certeza plena e confiança irrestrita, que abre as portas de nosso coração à sua presença e ação, mesmo que não o enxerguemos com os olhos de nosso corpo físico.

 

É uma doutrina que deveria converter os mais incrédulos pelo seu encanto e pela sua doçura: a dos anjos guardiães. Pensar que se tem sempre perto de si seres que vos são superiores, que estão sempre aí para vos aconselhar, vos sustentar, vos ajudar a escalar a áspera montanha do bem, que são os amigos mais seguros e mais devotados do que as mais íntimas ligações que se possa contrair sobre esta Terra, não é uma idéia bem consoladora? Esses seres aí estão por ordem de Deus; ele os colocou juntos de vós e aí estão, por seu amor, cumprindo uma bela, mas penosa missão. Sim, onde estejais, ele estará convosco: as prisões, os hospitais, os lugares de devassidão, a solidão, nada vos separa desse amigo que não podeis ver, mas do qual vossa alma sente os mais doces estímulos e ouve os mais sábios conselhos.

Deveríeis conhecer melhor esta verdade! Quantas vezes ela vos ajudaria nos momentos de crise; quantas vezes ela vos salvaria dos maus Espíritos! (...) Ah! Interrogai vossos anjos guardiães (através do recolhimento e da prece); estabelecei entre eles e vós essa ternura íntima que reina entre os melhores amigos. Não penseis em esconder-lhes nada, porque eles têm os olhos de Deus, e não podeis enganá-los.

(...) Àqueles que pensem ser impossível aos Espíritos verdadeiramente elevados, se sujeitarem a uma tarefa tão laboriosa e de todos os instantes, diremos que influenciamos vossas almas estando a vários milhões de léguas de vós. Para nós o espaço não é nada, e vivendo em outro mundo, nossos Espíritos conservam sua ligação com o vosso. (...) Cada anjo guardião tem o seu protegido sobre o qual vela, como um pai vela sobre seu filho, e é feliz quando o vê no bom caminho, e sofre quando seus conselhos são menosprezados.

Não temais em nos fatigar com vossas perguntas; estejais, ao contrário, sempre em relação conosco: sereis mais fortes e mais felizes. [5] 

 

 

Silvia Helena Visnadi Pessenda

sivipessenda@uol.com.br

 

 

REFERÊNCIAS

 

[1] KARDEC, Allan. O Evangelho segundo o Espiritismo. Tradução de Salvador Gentile, revisão de Elias Barbosa. 195. ed. Araras, SP: IDE, 1996. Cap. 4. Item 18.

 

[2] ESPÍRITOS diversos; XAVIER, Francisco Cândido (psicografado por). À luz da oração: Antologia de Preces Mediúnicas. 5. ed. Matão: Casa Editora O Clarim, 1993. Cap “Oração e Atenção”. p. 168.

 

[3] SCHUTEL, Cairbar (espírito); GLASER, Abel (psicografado por). Fundamentos da reforma íntima. 3. ed. Matão: Casa Editora O Clarim, 2000. Itens 71-73.

 

[4] ANDRÉ LUIZ (espírito); XAVIER, Francisco Cândido (psicografado por). Missionários da Luz. 31. ed. Rio de Janeiro: Federação Espírita do Brasil. Cap. 5. p. 52.

 

[5] KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. Tradução de Salvador Gentile, revisão de Elias Barbosa. 100. ed. Araras, SP: IDE, 1996. q. 495.

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