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“Nem todo o que me diz: Senhor, Senhor!
entrará no reino dos céus, mas aquele que
faz a vontade de meu Pai, que está nos céus.”
(Mateus 7:21)
“Nem todo o que me diz: Senhor, Senhor!
entrará no reino dos céus, mas aquele que
faz a vontade de meu Pai, que está nos céus.”
(Mateus 7:21)
É-nos possível viver sem o afeto das outras pessoas? Existe uma fonte de realização profunda? O que é necessário para que o amor possa existir e se manifestar? Por que existem pessoas que excluem de sua vida parentes, amigos e até filhos? Diferença significa divergência? Somos influenciados pelos relacionamentos que instituímos?
Como nota explicativa da questão 938, de O Livro dos Espíritos, Allan Kardec registrou:
“A Natureza deu ao homem a necessidade de amar e de ser amado. Um dos maiores prazeres que lhe seja concedido sobre a Terra é o de reencontrar corações que simpatizam com o seu.” [1]
Em nossa essência, existe instalada a necessidade de afeto, e não suportamos viver sem isso! Precisamos nos sentir amados, respeitados e de algo palpável que nos faça lembrar que o amor existe. Igualmente necessitamos das manifestações de carinho, de calor humano, de atenção, de cuidados.
Nossas buscas de felicidade poderão percorrer vários caminhos, mas todas elas serão frustradas se não descobrirmos que só existe uma única fonte de realização profunda: o amor. É ele que nos permite alcançar a absoluta satisfação de nossa verdadeira natureza. Nesse sentido, o Espírito Joanna de Ângelis enfatiza:
O ser humano necessita do calor afetivo de outrem, mediante cuja conquista amplia o seu campo de emotividade superior, desenvolvendo sentimentos que dormem e são aquecidos pelo relacionamento mútuo, que enseja amadurecimento e amor. Concomitantemente, espraia-se esse desejo de manter contato com as expressões mais variadas da vida, nas quais haure alegria e renovação de objetivos, por ampliar a capacidade de amar e de experienciar novas realizações.
O fluxo da vida humana se manifesta através dos relacionamentos das criaturas umas com as outras, contribuindo para uma melhor e mais eficiente convivência social. Nas expressões mais primárias do comportamento, o instinto gregário aproxima os seres, a fim de os preservar mediante a união de energia que permutam, mesmo que sem se darem conta.
O desafio do relacionamento é um gigantesco convite ao amor, a fim de alcançar a plenitude existencial. [2]
Torna-se incompleto discursar sobre o amor, se não abordarmos sobre o que é necessário para que ele possa existir e se manifestar: os relacionamentos, a convivência.
Ainda segundo O Livro dos Espíritos, na questão 766, os Espíritos Superiores afirmam que “Deus fez o homem para viver em sociedade. Deus não deu inutilmente ao homem a palavra e todas as suas faculdades necessárias à vida de relação”. [1]
O ser humano não existe como ser isolado no tempo e no espaço; ele é o produto das interações que estabelece com os demais. Somos, portanto, profundamente influenciados pelos relacionamentos que instituímos, necessitando deles para nos tornarmos seres completos e saudáveis.
Mas, conviver não significa, necessariamente, conhecer o que se passa no mundo íntimo das pessoas. O ditado popular “perto dos olhos, mas longe do coração” demonstra que, nem sempre, estar próximo denota reciprocidade de sentimentos, de interesses, de pontos de vista.
Todo relacionamento humano é uma via de mão dupla que se estabelece, sobretudo, pelo prazer e compensações emocionais que proporciona aos envolvidos; e ele não morre por si mesmo. E muitas relações definham, lentamente, porque as pessoas não compreendem o quanto ou que tipo de manutenção, tempo, trabalho e cuidados elas requerem. É também uma entidade viva, um processo dinâmico e em constante mudança, que precisa ser cultivado através da superação dos conflitos que, naturalmente, surgem; e, dependendo do nível de experiência, da habilidade de ajustamento e das próprias necessidades, cada pessoa irá responder de maneira diferente a esse desafio.
O ser humano de forma alguma pode viver sem os relacionamentos que lhe constituem fatores básicos para o enfrentamento dos desafios e o desenvolvimento dos valores que lhe jazem interiormente de forma embrionária. [3]
Estando nós, como espíritos imortais, regidos pela Lei de Sociedade [1], necessitamos dos contatos interpessoais, porque são eles oportunidades excepcionais de desenvolvimento interior. Neles é que revelamos nossas verdadeiras características e é através deles que temos a possibilidade de vencer o egoísmo, a raiva, a desconfiança, o medo, aprendendo mais sobre a generosidade, a tolerância e o perdão. Esse é o imprescindível trabalho interior que amplia o discernimento sobre o bem e o mal, que permite o encontro com a paz e a felicidade, bem como contribui para o progresso espiritual.
Kardec, na questão 768, de O Livro dos Espíritos, explica:
Nenhum homem tem as faculdades completas. Pela união social, eles se completam uns pelos outros para assegurar seu bem estar e progredir. Por isso, tendo necessidade uns dos outros, são feitos para viver em sociedade e não isolados. [1]
Tal progresso trata-se de um processo individual e coletivo, ao mesmo tempo. Individual, porque é a criatura que institui sua própria trajetória evolutiva; porém, coletivo, porque necessitamos das outras pessoas tanto quanto elas precisam de nós. O desenvolvimento e a realização de uma pessoa em determinado aspecto da vida, certamente, complementa o déficit de outra, e vice versa.
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Na obra O despertar do espírito, temos a seguinte fábula:
Numa já remota era glacial, os porcos espinhos sentiram-se ameaçados de destruição pelo intenso frio que reinava por toda parte. Por instinto, uniram-se e conseguiram sobreviver em razão do calor que irradiavam. Não obstante, pelo fato de estarem muito próximos, uns dos outros, passaram a ferir-se mutuamente, provocando reações inesperadas, quais o afastamento de alguns deles. Como consequência da decisão, todos aqueles que se encontravam distantes passaram a morrer por falta de calor. Os sobreviventes, percebendo o que acontecia, reaproximaram-se, agora porém, conhecedores dos cuidados que deveriam manter, a fim de não se magoarem reciprocamente. Graças a essa conclusão feliz, sobreviveram à terrível calamidade...
O espírito de Ângelis comenta:
Trata-se de excelente lição para uma feliz convivência, um produtivo relacionamento, respeitando-se sempre os valores daquele a quem se busca, sua privacidade, seus sentimentos, suas conquistas e prejuízos, que fazem parte da sua realidade pessoal. [4]
Os relacionamentos de qualquer natureza dependem sempre do nível de consciência daqueles que estão envolvidos. Havendo maturidade psicológica e compreensão de respeito pelo outro, facilmente se aprofundam os sentimentos, mantendo-se admirável comunhão de interesses e afinidades, que mais se intensificam, à medida que as circunstâncias permitem o entrosamento da convivência. [5]
Segurança, alegria e sucesso na vida estão diretamente associados à capacidade de nos relacionarmos uns com os outros, porém, com maturidade psicológica e comprometimento com o bem-estar geral. Essas são as posturas das criaturas que demonstram espírito de conciliação, flexibilidade no comportamento e discernimento para, adequadamente, compreenderem as particularidades de cada indivíduo.
Entretanto, em nosso proceder diário, constatamos o quanto a falta de habilidade e conhecimento restringe a vivência da harmonia. Alguns de nossos bons momentos são destruídos pela crítica, pela censura e competição, pelos julgamentos rígidos, limitando consideravelmente nossos intercâmbios interpessoais.
Não existem duas pessoas rigorosamente iguais. Cada indivíduo possui um modo bastante específico de ser e de pensar, de se expressar e de manifestar seus sentimentos e afetividade. Porém, o que ocorre na grande maioria das relações é que, se as opiniões são divergentes, por exemplo, cada um tenta impor seu ponto de vista, fazendo com que o diálogo acabe em discussão.
Quantas são as pessoas que excluem, de sua vida, parentes, amigos e até filhos, por não tolerarem as contrariedades e as diferenças. Entretanto, cada um de nós possui qualidades únicas, que podem enriquecer nossas interações! Os relacionamentos mais consistentes são justamente aqueles que se alicerçam na premissa de que diferença não significa divergência.
Entre os seres humanos é que surgem os grandes desafios psicológicos, aqueles que decorrem do nível de consciência individual, do seu desenvolvimento de sentimentos, do estágio de maturidade em que cada qual se encontra.
Por essa razão, é indispensável que sejam criadas emoções que facultem união, intercâmbio, a fim de serem atingidos os objetivos básicos da existência corporal, que são as expressões da lídima fraternidade.
Nessa busca saudável de comunhão com os semelhantes, a alegria se irradia em forma de otimismo e esperança, que são fundamentais à existência equilibrada.
Todo ser humano é portador de força criadora que se desenvolve através do relacionamento com o outro da mesma espécie. Para o êxito do cometimento, torna-se fundamental o autodescobrimento, a fim de serem identificados o lado negativo que faz parte da personalidade, a face escura desse poder natural, evitando que predominem nas relações que sejam estabelecidas. Enquanto forem ignorados esses ângulos ainda deficientes e perturbadores, os desentendimentos entre aqueles que se buscam, fazem-se predominantes ao invés das identificações que os devem unir, porque cada qual pretende impor-se sobre o outro, olvidando que nessa atividade de relacionamento não há valor que se sobreponha ou que se submeta, mas que todos se encontram no mesmo patamar de interesse e de significação estabelecendo linhas de perfeito respeito recíproco.
O bom relacionamento é aquele que resulta do contato que inspira, que emula e que proporciona bem estar, sem conteúdos temerosos ou repulsivos, geradores de ansiedade e de mal estar.
Cada pessoa tem algo a oferecer para o grupo social no qual se movimenta, e esse contributo é importante para o conjunto, que o não pode prescindir. Qualquer imposição que decorra do capricho egóico de algum dos membros, torna-se fator de impedimento para a saudável formação da sociedade. É por isso que os dominadores, os poderosos, aqueles que se impõem, tornam-se temidos, mas nunca amados.
(...) Desse modo, o indivíduo que admite a própria fragilidade, a sua humanidade, e compreende a necessidade da presença de outrem para avançar, está preparado para a convivência social, para um relacionamento eficaz. Enquanto nele predominem a presunção e a exclusiva autossatisfação, defrontará muitas dificuldades para se harmonizar na sociedade, porque não pode vencer a ambição mórbida da autoprojeção.
(...) Um relacionamento psicologicamente maduro é sempre sustentado pela lealdade de convivência, na qual os propósitos que vinculam os indivíduos entre si são discutidos com naturalidade e sentimento de aprendizagem de novos recursos para o bom desempenho social.
Sendo cada pessoa um elo da imensa corrente que deve reunir todos os homens e mulheres, o ajustamento emocional ao grupo é indispensável, contribuindo para o fortalecimento da estrutura comportamental de todos.
(...) A sociedade equilibrada deve funcionar como um orquestra afinada executando especial obra sinfônica, na qual predomina a harmonia dos movimentos e das notas musicais sob a regência feliz do ideal que proporciona alegria e paz.
Para que isso seja logrado, o amor desempenha um papel especial: o de conseguir superar as dificuldades naturais da fase inicial da identificação, quando todos ainda não se conhecem e mantêm o compreensível receio de suscetibilização de um em relação ao outro, ou de não poderem corresponder ao que de cada qual é esperado.
O amor, em qualquer situação, produz enzimas psíquicas que contribuem eficientemente em favor do metabolismo social, produzindo o quimismo necessário à renovação de todas as suas células e do organismo total como efeito inevitável. [6]
Silvia Helena Visnadi Pessenda
REFERÊNCIAS
[1] KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. Tradução de Salvador Gentile, revisão de Elias Barbosa. 100. ed. Araras, SP: IDE, 1996.
[2] ÂNGELIS, Joanna de (espírito); FRANCO, Divaldo Pereira (psicografado por). O despertar do espírito. 4. ed. Salvador, BA: Livr. Espírita Alvorada, 2000. Cap. “Relacionamentos humanos”. p. 135.
[3] Idem. p. 133-134.
[4] Idem. p. 135-36.
[5] Idem. p. 141.
[6] Idem. p. 148-152.